Um dos sonhos da maioria dos enófilos é ter uma adega em casa. E para quem é mesmo fã da bebida e toda semana gosta de escolher alguns vinhos para degustar em casa, sozinho ou com a família e os amigos, manter uma adega é mesmo interessante. Há um problema, porém. Como gerenciá-la?
Antes de entrar nesse mérito, é bom voltar ao princípio. Antes de adquirir uma adega climatizada, você precisa fazer alguns cálculos de quantos vinhos consome e quantos vinhos compra por mês em média. É simples, se você compra seis garrafas por mês e consome apenas metade delas, ao final de um ano precisa ter espaço para guardar mais de 30 garrafas na adega. Dessa forma, uma adega de 50 lugares ficará abarrotada logo. Ou seja, opte por tamanhos a partir de 50 lugares, a não ser que você esteja preocupado somente em ter vinhos de consumo rápido (nesse caso, talvez nem valha a pena ter uma adega).
Adega escolhida, o próximo dilema é como recheá-la. Se você está mais preocupado em manter uma variedade boa de estilos para poder escolher dependendo da ocasião, pense primeiro nos tipos: espumantes, brancos, rosés, tintos e doces. Mesmo que você tenha preferência por algum deles, é sempre bom ter um leque que abranja todos esses tipos para poder estar preparado para qualquer situação. Depois, também é interessante reservar um espaço para aqueles vinhos de guarda que você quer abrir em momentos especiais no futuro.
Proporções
Mesmo que sua ideia em ter uma adega esteja mais focada na variedade de opções do que nos vinhos de guarda, é interessante reservar de 10 a 15% dos lugares para aqueles rótulos especiais que você não abrirá imediatamente e pretende guardar dois ou mais anos antes de provar. Então, em uma adega de 50 lugares, de cinco a seis, ou seja, uma gaveta provavelmente ficará dedicada àquelas garrafas mais longevas.
Depois, como dissemos antes, vale a pena pensar em variedade de estilos. Primeiramente, vamos tratar dos espumantes. É importante ter de três a cinco garrafas sempre em mãos, pois, além de serem excelentes aperitivos e combinarem com quase qualquer tipo de comida, são ótimos para os momentos de celebração. Seu espocar marca uma ocasião festiva. Dentre essas garrafas, opte pelo Brut preferencialmente e, se sobrar espaço, algum Demi-Sec ou Moscatel. Se quiser, nem precisa sair do Brasil para escolher, pois há ótimas opções aqui, com espumantes de método tradicional e Charmat com preços excelentes. Para variar, há alternativas em conta como os Prosecco italianos e os Cava espanhóis. Se puder, tenha também ao menos um Champagne.
Em seguida, mesmo que você não seja um fã de vinhos brancos, tenha sempre alguns na adega, pois eles também servem como aperitivos e vão harmonizar bem com mais pratos leves. Tenha, então, em torno de cinco garrafas variadas estocadas. Há duas variedades básicas que não devem ficar de fora: Chardonnay e Sauvignon Blanc. Ambas são capazes de gerar bons vinhos nos mais diversos lugares do planeta e agradar muita gente. Para dar ainda mais cor a esse leque de vinhos, pode-se ter algumas castas menos comuns, como Alvarinho (dos Vinhos Verdes, por exemplo), Sémillon, Gewürztraminer, Torrontés, Viognier ou Chenin Blanc. Não se pode esquecer dos Riesling, sempre muito ecléticos. Os vinhos rosés, ótimos para tempos de calor e polivalentes ao lado da comida, também merecem estar em sua adega. Experimente ter um da Provença, na França, que sempre se destaca por seu frescor e mineralidade.
Tintos
Indubitavelmente, os tintos são os vinhos de preferência da maioria das pessoas, portanto, acabam ficando com um bom espaço. Ter de 10 a 15 garrafas não é um exagero e, além do mais, é possível variar bastante. Primeiramente, pense em potência, separe os tintos em leves, de médio corpo e encorpados e tenha uma mescla desses estilos. Dentre os leves, que geralmente não passam por barrica ou quando passam é por pouco tempo, vale optar por Pinot Noir (brasileiros, chilenos e argentinos são os mais fáceis de encontrar, mas há opções em conta da Nova Zelândia), Bonarda, Barbera, além de rótulos mais simples de Merlot, Cabernet Sauvignon, Syrah etc da Argentina, Brasil, Chile, Portugal e Espanha (os ditos “jóven” são deste estilo). Esses vão ser vinhos de entrada, fáceis de beber, para bebericar durante uma conversa e acompanhar pratos mais leves. Diante disso, se quiser ter uma proporção maior deles, tudo bem.
Depois, pode-se passar aos de médio corpo e encorpados. Dessa forma, boa parte são vinhos que passam algum tempo maturando em barrica e alguns bons exemplos são os Tempranillo espanhóis ditos Crianza, os Chianti, os portugueses do Alentejo, além dos Carménère chilenos e Malbec argentinos e também um grande número de Merlot do mundo todo, incluindo o Brasil. Rótulos de vinhos Bordeaux mais simples também se enquadram aqui. Esses tintos vão casar bem com a comida e também não cansarão demasiadamente o paladar caso sejam provados sozinhos.
Em uma adega de 50 lugares é possível ter uma excelente diversidade de vinhos para todas as ocasiões e ainda ter espaço para rótulos especiais
Entre os encorpados, além dos imponentes Tannat uruguaios e alguns Cabernet Sauvignon de peso da América do Sul, há ainda os Touriga Nacional portugueses, sempre muito saborosos, os Primitivo, e outros italianos potentes feitos com Nebbiolo. Pode-se optar ainda por bons blends GSM (Grenache, Syrah e Mourvèdre) de origem francesa, mais especificamente do Rhône, e outras tantas mesclas como os Bordeaux mais parrudos e os portugueses do Douro, por exemplo. Esses vinhos geralmente serão reservados para momentos em que estarão ao lado de comida (preparações mais pesadas e elaboradas) ou para agradar paladares que gostam de bebidas mais potentes.
Espaço para tudo
Por fim, não se pode esquecer dos vinhos doces e fortificados, que sempre nos deleitam ao final de uma refeição ou então fazem uma harmonização sedutora (por contraste) com alguns queijos curados, como Parmesão, e também azuis, como Roquefort. Talvez duas garrafas bastem: uma de um Porto Tawny, Ruby ou LBV – que, além de digestivos, podem fazer companhia para as sobremesas de chocolate – e outra de um Late Harvest ou algum outro vinho feito com uvas de colheita tardia, que tenham ou não sido afetadas pelo fungo Botrytis. Esses vinhos brancos doces e ácidos podem ser degustados sozinhos ou então ao lado de cremes de frutas, por exemplo.
Fazendo as contas, em uma adega de 50 garrafas, se você tiver cinco espumantes, cinco brancos, um rosé, 15 tintos e dois doces, são 27 lugares. Se considerar mais uma gaveta com seis lugares para rótulos especiais de longa guarda, chega-se a 33 e ainda sobra espaço para você usar como bem entender (sem lotar!), como quando quer comprar mais garrafas de um mesmo vinho – para harmonizar com uma receita, por exemplo, ou pretende prová-lo ao longo dos anos para ver como ele evolui.
Um alerta: ao comprar uma adega, geralmente sentimonos impelidos a comprar mais vinhos para preenchê-la. Uma dica para quem de repente se vê sem espaço é realocar seus vinhos de consumo imediato para a geladeira, de preferência espumantes e brancos, cujas temperaturas de serviço são mais próximas das do refrigerador (entre 5o e 10o C). A pouca umidade desse ambiente pode ressecar as rolhas, mas, se for por pouco tempo (menos de uma semana), não há problema. Porém, se possível, evite.